Leap Day
De quatro em quatro anos celebramos um dia extra em Fevereiro. Não sei se em Portugal tem algum significado ou não, mas aqui em Inglaterra - onde estou - este dia chama-se 'Leap Day' e de acordo com a tradição, é o único dia em que supostamente a mulher pode pedir um homem em casamento.
Reza ainda a tradição que, se o homem rejeitasse a proposta da mulher, este teria de lhe dar dinheiro, comprar-lhe um vestido ou um casaco de peles! Entre as classes média-altas da sociedade, se o homem se recusasse a casar após receber um pedido no Leap Day, teria de comprar 12 pares de luvas para a mulher rejeitada - evitando assim o constrangimento de ela ter de se apresentar publicamente sem um anel de noivado no dedo.
Não deixa de ter a sua piada. Numa altura de grandes mudanças sociais e culturais, em que os convencionalismos deixam de ter qualquer sentido e a igualdade entre os sexos começa finalmente a ganhar algum peso, este dia começa a perder o seu simbolismo antigo. Ficará com certeza para a história como uma das primeiras oportunidades para as mulheres se exprimirem de forma livre e independente sobre aquilo que sentem, mesmo que o intuito final fosse assegurar um casamento.
Reza a história que há muitas mulheres que hojem pedem os homens em casamento. Não significa isso que queremos quebrar normas ou convencionalismos, nem tão pouco significa que somos oferecidas ou vendidas. Apenas sabemos o que queremos e estamos dispostas a lutar por isso. Quando entramos nos trintas, depois de uma vida de namorados, viagens e experiências, começamos a entrar numa fase de estabilidade profissional maior. Temos uma noção da vida e das coisas que queremos e não queremos bem maior do que quando atravessamos os vintes. Mas não deixamos de confiar no amor e nas coisas que fazemos por amor, mesmo depois das desilusões e das bagagens emocionais que carregamos. Eu pelo menos nunca deixei de acreditar que um dia vou ser feliz a esse respeito. E por isso continuo a ter fé no amor e na união de duas pessoas que se querem bem e se respeitam.
Não vou mentir e dizer que sou perfeita. Ninguém é perfeito. Mas vivi sempre a minha vida de acordo com as minhas normas e as minhas regras,sem passar por cima de ninguém, sendo sempre verdadeira e dizendo de cara aquilo que penso. Nunca precisei de homem nenhum para reconhecer o valor que tenho como pessoa, como profissional, e agora como mãe de duas meninas lindas. Eu sei o meu valor, e por muito que me rebaixem e me chamem aquilo que quiserem, vivo de consciência tranquila, e sei que o exemplo que estou a dar ás minhas filhas, é um exemplo de coragem e de braveria. Na minha situação atual, muitas mulheres continuariam a viver um casamento infeliz e desigual, por medo de passarem necessidades ou de não conseguirem dar a volta por cima com duas crianças a reboque.
Mas eu estou rodeada de pessoas que me querem bem e querem que eu seja feliz, pessoas que convivem diáriamente comigo e que sabem reconhecer as minhas lutas e os meus medos sem apontar um dedo incriminador, sempre sinceros comigo para o que é bom e para o que é mau. Esses meus amigos, que vivem ao meu lado - e não a léguas de distância - sabem daquilo que falo, e estão prontos a ajudar assim que a dificuldade bate á porta. E são esses meus amigos que eu chamo de segunda família.
Eu fiz deste país o meu país. Vim para cá em 2004 e tudo o que construí foi com o meu suor, a minha luta diária, entre saudades da família, e vontade de voltar para aquela que foi a minha casa durante mais de 25 anos. Mas não voltei. Persisti. Insisti. Continuei em frente. Entre 2004 e 2010 contruí a base de tudo o que tenho, fiz isso sozinha, bem antes de decidir ser esposa e mãe. Depois de ter tomado a decisão de casar, fui eu que pedi em casamento o pai das minhas filhas. E não tenham dúvidas, ele foi o grande amor da minha vida. Mas as pessoas vão mudando, as prioridades também, e é muito complicado tentar consertar algo que já se partiu há muito tempo. Não há cola nem remendo que faça um copo partido voltar a ficar bom para beber água.
O tempo provou-me que eu estava certa em ter tomado a decisão que tomei. Para mim, viver o casamento não foi fácil. Viver a maternidade também não, em parte porque o casamento que eu tinha sempre foi frágil. Ambos tinhamos maneiras diferentes de viver a vida a dois, a três e mais recentemente a quatro. Eu tenho uma visão moderna da vida a dois. Não terei sido a única a tropeçar enquanto caminhava para a felicidade. E não será provavelmente o ultimo tropeção que vou dar. Mas pelo menos aprendi que duas pessoas que falam a mesma língua, nem sempre se entendem ou pensam da mesma forma, e que o facto de partilharmos algo especial durante anos não significa que um dia não dê errado. A vida tem sempre uma maneira de nos dizer que é tempo de recomeçar de novo.